sexta-feira, 31 de julho de 2020

Infância



INFÂNCIA
(Carlos Drummond de Andrade)

Meu pai montava a cavalo, ia para o campo.
Minha mãe ficava cosendo.
Meu irmão pequeno dormia.
Eu sozinho menino entre mangueiras
lia a história de Robison Crusoé,
comprida história que não acaba mais.

No meio-dia branco de luz uma voz que aprendeu
a ninar nos longes da senzala - e nunca se esqueceu
chamava para o café.
Café preto que nem a preta velha
café gostoso
café bom.

Minha mãe ficava sentada cosendo
olhando para mim:
- Psiu ... Não acorde o menino.
Para o berço onde pousou um mosquito.
E dava um suspiro ... que fundo!

Lá longe meu pai campeava
no mato sem fim da fazenda.

E eu não sabia que minha história
era mais bonita que a de Robinson Crusoé.

***

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