Morreu nesta manhã de domingo aos 86 anos, o escritor, poeta, critico de arte, dramaturgo, tradutor, biografo, Ferreira Gullar. O maranhense José Ribamar Ferreira Gullar foi empossado imortal na Academia Brasileira de letras em 2014. Foi militante do partido Comunista e durante a Ditadura Militar, o poeta foi preso e exilado, e viveu na União Soviética, na Argentina e Chile. Recebeu o
Prêmio Camões, o mais importante da língua portuguesa. "Poema Sujo"
(1976) foi considerado um marco da literatura brasileira e traduzido
para diversas línguas. Descanse em paz!
Traduzir-se
Uma parte de mim
é todo mundo:
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.
Uma parte de mim
é multidão:
outra parte estranheza
e solidão.
Uma parte de mim
pesa, pondera:
outra parte
delira.
Uma parte de mim
almoça e janta:
outra parte
se espanta.
Uma parte de mim
é permanente:
outra parte
se sabe de repente.
Uma parte de mim
é só vertigem:
outra parte,
linguagem.
Traduzir-se uma parte
na outra parte
– que é uma questão
de vida ou morte –
será arte?
é todo mundo:
outra parte é ninguém:
fundo sem fundo.
Uma parte de mim
é multidão:
outra parte estranheza
e solidão.
Uma parte de mim
pesa, pondera:
outra parte
delira.
Uma parte de mim
almoça e janta:
outra parte
se espanta.
Uma parte de mim
é permanente:
outra parte
se sabe de repente.
Uma parte de mim
é só vertigem:
outra parte,
linguagem.
Traduzir-se uma parte
na outra parte
– que é uma questão
de vida ou morte –
será arte?
Meu povo, meu poema
Meu povo e meu poema crescem juntos
como cresce no fruto
a árvore nova
como cresce no fruto
a árvore nova
No povo meu poema vai nascendo
como no canavial
nasce verde o açúcar
como no canavial
nasce verde o açúcar
No povo meu poema está maduro
como o sol
na garganta do futuro
como o sol
na garganta do futuro
Meu povo em meu poema
se reflete
como a espiga se funde em terra fértil
se reflete
como a espiga se funde em terra fértil
Ao povo seu poema aqui devolvo
menos como quem canta
do que planta
menos como quem canta
do que planta
POEMA SUJO
Ah, minha cidade suja
de muita dor em voz baixa
de vergonhas que a família abafa
em suas gavetas mais fundas
de vestidos desbotados
de camisas mal cerzidas
de tanta gente humilhada
comendo pouco
mas ainda assim bordando de flores
suas toalhas de mesa
suas toalhas de centro
de mesa com jarros
- na tarde
durante a tarde
durante a vida -
cheios de flores
de papel crepom
já empoeiradas
minha cidade doída
...
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